quarta-feira, 25 de março de 2009

O jornalista, seu texto e o Google

Rafael Nobre

ARTIGO - O jornalista de jornal impresso, revista ou internet ama o seu texto com todas as forças. Gosta mais do texto que da pessoa com quem ele juntou as escovas de dente. Essa paixão vai além do quanto ele gosta de viajar a trabalho, com a empresa pagando tudo, é claro. Isso vai além do sorvete de chocolate ou da crítica de cinema feita por ele e que todos concordaram. Isso já era de se esperar, afinal, ele viu o texto nascer quando ainda era apenas uma pequena pauta que o editor passou com um certo desdém.

No processo de redação, o jornalista tem que analisar as possíveis fontes de pesquisa instantâneas, como sua bagagem cultural, um baú inesgotável de conhecimento superficial que serve de ponto de partida para um longo e belo texto, e é claro, o Google. Todo jornalista é um grande generalista, um especialista que sabe de tudo um pouco. Ele não precisa conhecer o nível de acidez do rio Negro, que torna suas águas escuras o suficiente para lhe garantir esse nome, mas tem que estar ciente que aquele rio não é escuro por acaso. Isso já basta para aguçar o sentido-aranha do jornalista e garantir uma pesquisa regular, que sirva como gancho a uma grande reportagem digna do prêmio Esso.

Nesse processo de produção textual, o Google é um grande parceiro. O site de buscas mais acessado do mundo, possuidor da marca de maior valor de mercado há quatro anos consecutivos, pode render mais do que se imagina. Mas, voltando ao texto em si, quando o jornalista recebe a pauta e a explicação sobre o que o editor espera daquele tema e suas possíveis abordagens, a mente do jornalista já começa a maquinar o que ele fará para atingir as expectativas do seu chefe.

Começa quase sempre assim: O repórter senta na sua cadeira e verifica os e-mails e demais fontes de comunicação existentes na Internet que possam garantir uma pauta melhor que aquela proposta – quando existe a opção de mudar de pauta, uma verdadeira raridade. Depois pensa melhor na pauta e começa a viajar no assunto. Olha para a tinta descascando da parede da redação que parece com a cabeça já desprovida de cabelo do diretor da redação, e inicia o alinhamento das palavras. Ele imagina o texto ganhando vida na fonte Times New Roman, corpo 12 e cor preta. Depois vem aquele sorriso de satisfeito e o olhar perdido, indicando que já está na hora de passar as idéias para o computador. Quando termina de digitar, lê uma, duas, três, quatro vezes. E, por fim, está pronto. A criação que saiu das profundezas da sua cabeça e dos links do Google pode finalmente ser entregue ao editor.

O editor pega o texto e, como um juiz, tem o poder de condenar ou absolver o texto. Para não perder a reputação de inteligente e dizer que seu conhecimento está acima da média dos repórteres e fazer jus ao cargo que ocupa, pede para o parágrafo final ser reescrito, pois a idéia final precisa ser mais “amarrada”. Este é o final feliz da saga do pequeno texto. O final triste seria o editor utilizar o back space mais que deveria e cortar metade da produção intelectual do pobre jornalista. Isso o condenaria a reescrever tudo e passar pelo processo de criação novamente.
Não que escrever seja uma tortura, mais refazer do início e conceber uma nova idéia daquilo que já está ou estava pronto, não é nada fácil. Mas esta é a vida do jornalista, um dia é do repórter, outro do editor. Só mesmo o repórter para tratar o texto com todo o afeto que ele merece. E só um editor para não entender isso.

Um comentário:

  1. Adorei o texto, é exatamente assim que acontece durante o processo de produção de nossas belíssimas matérias! Me ví no texto, rsrs.

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